quarta-feira, 24 de maio de 2017

NELSON DOS REIS (In memoriam)

Corria o ano de 1980, o Brasil vivia tempos de “abertura política” e a ditadura militar ia chegando ao fim, respirava-se um ar de esperanças, e o ABC Paulista vivia momentos de movimentação sindical,política, social,econômica, etc...
Nesta época eu fazia um curso de Teatro na Fundação das Artes de São Caetano do Sul,quando o famoso e reconhecido bailarino e coreografo Klaus Viana ministrou uma Oficina de Dança a todos os estudantes de Artes Cênicas e aos Grupos de Teatro Amador do ABCD, quando conheci Nelson dos Reis, jovem ator e militante político/cultural que naquele momento era presidente da FEANTA-Federação Andreense de Teatro Amador , alem de trabalhar no DEPEC – Departamento de Esporte e Cultura de São Caetano do Sul como animador cultural.
Na época eu residia em São Bernardo do Campo,palco da cena política do Brasil, com a emergente liderança do LULA e da criação do Partido dos Trabalhadores e lá estava também o incansável Nelson dos Reis participando do ABCD- Sociedade Cultural,uma entidade criada a partir do Fundo de Greve do Sindicato dos Metalúrgicos de SBC, e que promovia varias atividades,tais como jornalismo,assistência jurídica,ação cultural,etc todas estas atividades sem fins lucrativos e realizadas por voluntários, militantes e de várias colorações ideológicas.Neste espaço cultural havia um Grupo de Teatro Amador , animado pelo diretor Lineu Constantino,que ministrava oficinas de preparação de atores,visando futuras montagens teatrais , mambembes e voltadas a população da região.Nelson era um dos lideres do grupo e convidou-me a participar,convite aceito  passei a integrar a trupe, e veio nossa primeira montagem,a partir de uma criação coletiva que se intitulava A INCRÍVEL HISTORIA DO HOMEM QUE VIROU CÃO ,  contava a historia de um desempregado que no limite das necessidades aceitou o “emprego” de cão de guarda de uma fábrica e metamorfoseou-se em cachorro, e o ator principal foi o Nelson que impressionava pelo desempenho, alem da Kátia que era a esposa assustada, o Bráulio que fazia o coringa,o Kioshi que era a banana ambulante,o Paulo o pregador de rua , o China um metalúrgico e eu o patrão etc... e assim nossa comedia rodou vários bairros , perfazendo 82 apresentações,fazendo rir e se possível fazendo pensar,seguindo a proposta de Brechet.

Ao lado de toda esta movimentação ia sendo criado o PT e o espaço que utilizávamos para ensaios era o espaço do Diretório Provisório então a convivência era mútua e os ideais eram comuns, ai o Nelson foi o primeiro a se filiar, eu o segundo e na sequência nós todos...um fato muito interessante,terminado os ensaios aos sábados nos reuníamos no bar do Paraquedas, na Praça Lauro Gomes,e numa noite destas encontramos Julio de Gramont e o Augusto, que organizavam a eleição do primeiro Diretório e tinha concebido uma bandeira para o PT que consistia eu um retângulo vermelho com uma estrela ao centro e ao meio a sigla PT...tomavam uma cerveja e tentavam rascunhar uma estrela, só que era de seis pontas, a de David, então  pediram ajuda, a mim e ao Nelson ,pois a estrela tinha que ter só cinco,eu que na época era desenhista e tirei de letra...ai recebi uma tarefa desenhar o rascunho da bandeira,que depois foi levado para a esposa do LULA , a Marisa Letícia que a confeccionou em tecido e esta bandeira ficou por muito tempo na parede da sala onde ensaiávamos e o Nelson sempre a reverenciava respeitosamente, pois tinha muita fé no nascente PT. Lembro-me também da primeira candidatura do LULA em 1982 para o Governo de SP,cujo lançamento foi na Praça Lauro Gomes,numa noite fria e garoenta onde o Nelson entusiasmado empenhou-se de corpo e alma na preparação e realização do evento, e ao final sorria feliz,pois tínhamos tido um publico de umas 5 mil pessoas.O tempo foi passando, a nossa convivência sempre muito próxima, conversávamos muito sobre tudo e todos, concordávamos ou divergíamos, mas uma coisa sempre deixava tudo em paz, o Nelson e seu violão , sempre a tira colo... e a primeira canção era Preta,Pretinha eu vinha te falar...musica que todos cantávamos.Ai veio a opção pelo jornalismo,entrou na Faculdade Casper Libero, e as vezes perdendo a hora,pedia-me uma carona de SBC ate a Av. Paulista , e eu de moto e ele na garupa cortávamos voando a Via Anchieta e num instante chegávamos lá.Nelson era poeta também, conseguiu com recursos próprios editar seu primeiro livro de poesias e alegria foi imensa,muitas comemorações com cervejinhas e o hambúrguer do Paraquedas até altas horas!
O tempo foi passando e lá estava o Nelson já formado e trabalhando na Editora Ática como editor onde entre centenas de títulos promeveu a publicação do livro "PT a Lógica da Diferença", da brasilianista norte americana Margaret E. Keck em 1991 quando o ajudei no lançamento do livro no Saguão do Teatro Municipal de Santo André-SP com as presenças da autora,do Lula e do saudoso Celso Daniel,então prefeito da cidade em seu primeiro mandato.
Tempos depois,Nelson sempre arrojado junto com sua esposa Rosa Zuccherato e do saudoso Luiz Bagio, fundaram sua própria editora, a Nova Alexandria, que hoje já é uma referencia e um legado à cultura e à inteligência dos brasileiros.Saudades!

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